Mais um círculo

"esse amor me derreteu, ajoelha-te, esquece
me chupa e agradece; a quem te machuca, agradece..."


oi. por favor, onde é o banheiro?
quero dar um tapa na sua cara. eu bebi, bebi demais.
tua cara é a mais linda do mundo, eu quero acabar com ela.
meu salto quebrou, eu não tenho mais vícios. só bebo um pouco, às vezes.
quase sempre eu sou normal. mas hoje não.
a gente não ía vir p´ra cá, mas esse era o bar mais próximo,
por favor, onde é o banheiro?
dá p´ra parar de me olhar com desejo?
quero fugir daqui antes que eu arranque minha roupa antes que você
me abra as pernas antes que. meu cabelo agora é vermelho, vermelho
sangue. quase faz eu me cortar, mas não: já tenho um ferro enfiado
no meu peito e ele sangra muito quase sempre.
tá ouvindo esse grito? é a mulher que mora no meu peito,
quando eu bebo ela dá as caras. o nome dela é Madalena.
ela grita e chora p´ra legitimar o nome. você acha que sou louca?
eu bebi demais? quero dar um tapa na tua cara, eu te odeio há anos.
você me fez sofrer tanto, por tanto tempo; e agora eu quero matar
você. você geme alto? quero ouvir tua voz, teu sotaque arrastado.
pisotear as tuas costas com o salto que ainda me resta.
onde é o banheiro? cadê o teu carro? me leva daqui.
quero ir embora daqui, eu não quero chorar.
hoje é aniversário da Madalena, ela quer uma festa.
ela gosta de conhaque, ela morreu en la santa inquisición. depois
vagou por aí agora se alojou no meu peito. ela é espanhola.
quer ver como ela dança? quer ver como ela é linda?
quase tão linda quanto você. se você fosse mulher, seria Madalena.
eu rezo sempre por você, teu rosto é tão triste...você já foi feliz?
já amou alguém? mentira, você nunca me amou. eu rasguei tuas fotos
todas, eu apaguei você de mim. eu não sabia que você já estava curado.
me leva daqui. por favor. antes que meu peito
se desfaça em sangue. não, não estou bêbada, eu não sou perigosa. prometo.
Madalena está chorando, chorando como uma Madalena. ela veste vermelho.
ela te ama. ela quer foder com você. não chora, meu bem.
você está vivo. eu tenho uma letra feita à lâmina na virilha.
olha o meu braço. cheio de marcas: você me perdoa?
você geme alto? prometo não chorar se...

(Por Letícia Helena... Da qual sempre adorei os escritos)
Caminho das Águas